Décimo colóquio, realizado em 30 de Março.
1 – Biografia
- Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em 15 de Outubro de 1844, em Röcken, pequena cidade em uma província prussiana da Saxônia.
- Estudou filologia clássica, embora tenha feito um semestre de teologia (por desejo da mãe, afinal seu pai era pastor). Durante o período universitário, teve contato com as obras de Arthur Schopenhauer e David Strauss. Foi professor em Basel entre 1869 e 79.
- O compositor Richard Wagner foi durante muitos anos um dos seus poucos e melhores amigos. Porém, discordâncias intelectuais e problemas pessoais levaram ao rompimento entre ambos, com Nietzsche acusando Wagner de ter se integrado à “cultura germânica”.
- Sua produção filosófica foi prolífica ao longo da década de 1880, na qual habitou as mais diversas localidades (Nice, Sils Maria, Genoa e Turim, principalmente). Em 88, à beira do ataque de loucura que encerrou sua carreira, escreveu cinco obras e ainda deixou manuscritos incompletos. Sua excêntrica autobiografia, “Ecce Homo”, foi escrita nesse ano.
- Em Janeiro de 1889, sofreu um colapso mental, que se revelou irreversível, em uma rua de Turim. Sua mãe e sua irmã passaram a cuidar dele. Morreu uma década depois, em 25 de Agosto de 1900, na cidade de Weimar.
2 – Principais Obras
- “O Nascimento da Tragédia” (1872): um tratado sobre arte dramática grega. Sua contribuição foi a oposição estabelecida entre o apolíneo (racional, ordenado) e o dionisíaco (passional, caótico).
- “A Gaia Ciência” (1882): compilação de mais de 300 aforismos. Foi neste livro que o autor falou pela primeira vez em “eterno retorno” e na morte de Deus.
- “Assim Falou Zaratustra” (1885): obra mais poética de Nietzsche. Resgate aos pré-socráticos para criticar a resignação à fé e a humildade, e propor um novo homem, acima do próprio homem.
- “Além do Bem e do Mal” (1886): escrito de caráter mais político e ambicioso, propõe, por exemplo, que o cristianismo é platonismo para o povo e que o socialismo é ideologia de rebanho.
- “A Genealogia da Moral” (1887): continuação de “Além do Bem e do Mal”, é uma investigação histórica para entender a moralidade cristã. Discute o que são ideais ascéticos.
- “O Anticristo” (1888): seria o 1º volume da “Transvaloração de todos os valores”. Possui reflexões polêmicas sobre o cristianismo: “O Evangelho morreu na Cruz”.
3 – “O Crepúsculo dos Ídolos”
- Subtítulo: “Como Filosofar a Marteladas”. “Ídolos”: tudo aquilo que foi chamado de verdade até hoje. “Crepúsculo”: a velha verdade chega ao fim, eis a boa nova. Os alvos são desde ídolos eternos até as “idéias modernas”.
- “Prefácio”: Existe poder de curar mesmo no ferimento, e há mais ídolos que realidades no mundo.
- “Máximas e sátiras”: O que não me mata torna-me mais forte. Sem a música, a vida seria um erro. Procurei grandes homens e sempre encontrei somente os macacos do ideal deles.
- “O problema de Sócrates”: Os grandes sábios como tipos de decadência. Sócrates pertencia à classe mais baixa do povo, e era feio. O tipo criminoso é feio. Com a dialética a plebe chega ao alto, derrotando um gosto refinado. A ironia era uma espécie de ressentimento popular, e o dialético degrada a inteligência de seu antagonista. A luta contra os instintos foi apenas uma nova doença, e não um retorno à “virtude”.
- “A ‘razão’ na filosofia”: A moral é, no fundo, a negação dos sentidos. Só possuímos ciência enquanto aceitamos o testemunho de nossos sentidos, enquanto armamos e aguçamos nossos sentidos ensinando-os a se dirigirem ao fim que nos propomos. Quatro proposições: I – Outra realidade é absolutamente indemonstrável; II – A “essência das coisas” não passa de um mundo de aparências, uma ilusão de ótica moral; III – Falar de um “outro” mundo é uma vingança contra a vida a partir da fantasmagoria de uma “outra” (e “melhor”) vida; IV – A divisão entre mundo “real” e “das aparências” é sintoma de decadência, pois os sentidos são a única realidade.
- “Como o ‘mundo-verdade’ tornou-se uma fábula”: com o mundo-verdade abolimos também o mundo das aparências; é o fim do erro mais demorado, ponto culminante da humanidade.
- “A moral com manifestação contra a natureza”: Ao acreditar que é preciso matar as paixões, a Igreja é contrária à vida; tanto que prega a castração e a extirpação. A moral é uma idiossincrasia de degenerados que causou profundo mal.
- “Os quatro grandes erros”: I – Erro da confusão entre a causa e o efeito (trocar as condições pelos resultados); II – Erro da falsa casualidade (o espírito como causa); III – Erro das causas imaginárias (todo o domínio da moral e da religião); IV – Erro do livre-arbítrio (a habilidade teológica para tornar alguém “responsável”, para assim punir e julgar, encontrar culpados).
- “Aqueles que querem tornar a humanidade ‘melhor’”: O juízo moral tem em comum com o juízo religioso o crer em realidades que não existem. A moral da criação (hindus) e a da domesticação (cristãos) equivalem-se nos meios que utilizam para “melhorar” a humanidade.
- “O que os alemães estão na iminência de perder”: Os alemães são vítimas dos dois maiores narcóticos europeus: o álcool e o cristianismo. As grandes épocas da cultura são épocas de decadência política (ex.: Alemanha na Era Napoleônica, França depois da Restauração). Sendo assim, a cultura aristocrática deve ser estimulada, mesmo se isso gere decadência política.
- “Passatempos intelectuais”: A hipocrisia faz parte das épocas de sólidas crenças, e hoje é raro encontrar os verdadeiros hipócritas. A filosofia de Kant fornece a fórmula superior do funcionário de Estado: aborrecido e domesticado.
O egoísmo só tem valor se representa uma linha ascendente. Uma moral altruísta, baseada em motivos “desinteressados”, é quase a fórmula da decadência. É a desagregação dos instintos.
O cristão e o anarquista (mas também o socialista) são mais parecidos entre si do que se imagina. A partir de uma “bela indignação”, os dois atribuem o próprio mal-estar a algo, seja aos outros (anarquismo) ou a si mesmo (cristianismo). É como se alguém devesse ser culpado, e querem vingança para refrescar seu ódio mesquinho. Ambos, portanto, são decadentes.
Liberdade é ter a vontade de responder de si; ser indiferente à própria vida; pôr os instintos viris (de guerra e vitória) acima daqueles da “felicidade”. O homem livre é guerreiro, pois conquista seu valor. É preciso ter necessidade de ser forte.
Os grandes homens são como as grandes épocas – explosivos, e cuja condição primeira é uma longa espera e preparação para eles. Goethe e Napoleão foram dois dos poucos homens do século XIX que tentaram vencer os erros do século anterior (por exemplo, a sangrenta farsa da Revolução Francesa) por meio de um “retorno à natureza”; mas, não aquele de Rousseau (o 1º moderno, dotado de um desprezo enorme por si mesmo), porém a natureza sublime, livre e mesmo terrível.
- “O que devo aos antigos”: Aos gregos não devo absolutamente nada, pois eles não chegam aos pés dos romanos. Dionísio deve ser venerado, pois representa o instinto da vida, e a própria procriação como via sagrada. A orgia é sentimento de vida e de força transbordante. A vontade de viver dionisíaca é a chave para entender a tragédia – eis a eterna alegria do devir.
-“O martelo fala”: De fato, todos os criadores são duros. Somente o mais duro é o mais nobre.
4 – Influências
- Pós-modernos: tanto na estilística quanto no conteúdo, Nietzsche foi uma inspiração profunda para o pensamento considerado ‘pós-moderno’. Exemplos desse legado: perspectivismo, recusa às metanarrativas, filosofia assistemática, relativismo moral e a crítica radical aos valores da Modernidade. Ex.: Jacques Derrida, Gilles Deleuze, Michel Foucault.
- Existencialismo: Jean-Paul Sartre, Albert Camus e Martin Heidegger foram influenciados por idéias como a de que o homem deve definir a natureza de sua própria existência, assim como suas indagações sobre a existência de Deus.
- Ayn Rand: a obra desta romancista e filósofa libertária tem ecos nietzscheanos em vários aspectos, como o egoísmo racional em oposição ao altruísmo servil e o “super-homem” individualista e íntegro - John Galt ou Howard Roark, p. ex. Ainda nos EUA, o jornalista H. L. Mencken, de estilo corrosivo, traduziu algumas obras do filósofo alemão, valendo-lhe o apelido de “o Nietzsche americano”.
- Teoria das elites: o pensador falecido em 1900 demonstra aristocratismo ao reiterar que são raríssimos os homens que fazem alguma diferença para a humanidade. Portanto, o destino do mundo, inclusive o político, está nas mãos de alguns poucos dotados da “vontade de potência”.
- Do Nazismo ao Anarquismo: a revolta generalizada e muitas vezes contraditória de seu pensamento inspirou desde movimentos totalitários (o Nacional Socialismo alemão, que via em Hitler o “übermensch”) até posturas contrárias a todas as instituições sociais, como anarquistas e niilistas.
- Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em 15 de Outubro de 1844, em Röcken, pequena cidade em uma província prussiana da Saxônia.
- Estudou filologia clássica, embora tenha feito um semestre de teologia (por desejo da mãe, afinal seu pai era pastor). Durante o período universitário, teve contato com as obras de Arthur Schopenhauer e David Strauss. Foi professor em Basel entre 1869 e 79.
- O compositor Richard Wagner foi durante muitos anos um dos seus poucos e melhores amigos. Porém, discordâncias intelectuais e problemas pessoais levaram ao rompimento entre ambos, com Nietzsche acusando Wagner de ter se integrado à “cultura germânica”.
- Sua produção filosófica foi prolífica ao longo da década de 1880, na qual habitou as mais diversas localidades (Nice, Sils Maria, Genoa e Turim, principalmente). Em 88, à beira do ataque de loucura que encerrou sua carreira, escreveu cinco obras e ainda deixou manuscritos incompletos. Sua excêntrica autobiografia, “Ecce Homo”, foi escrita nesse ano.
- Em Janeiro de 1889, sofreu um colapso mental, que se revelou irreversível, em uma rua de Turim. Sua mãe e sua irmã passaram a cuidar dele. Morreu uma década depois, em 25 de Agosto de 1900, na cidade de Weimar.
2 – Principais Obras
- “O Nascimento da Tragédia” (1872): um tratado sobre arte dramática grega. Sua contribuição foi a oposição estabelecida entre o apolíneo (racional, ordenado) e o dionisíaco (passional, caótico).
- “A Gaia Ciência” (1882): compilação de mais de 300 aforismos. Foi neste livro que o autor falou pela primeira vez em “eterno retorno” e na morte de Deus.
- “Assim Falou Zaratustra” (1885): obra mais poética de Nietzsche. Resgate aos pré-socráticos para criticar a resignação à fé e a humildade, e propor um novo homem, acima do próprio homem.
- “Além do Bem e do Mal” (1886): escrito de caráter mais político e ambicioso, propõe, por exemplo, que o cristianismo é platonismo para o povo e que o socialismo é ideologia de rebanho.
- “A Genealogia da Moral” (1887): continuação de “Além do Bem e do Mal”, é uma investigação histórica para entender a moralidade cristã. Discute o que são ideais ascéticos.
- “O Anticristo” (1888): seria o 1º volume da “Transvaloração de todos os valores”. Possui reflexões polêmicas sobre o cristianismo: “O Evangelho morreu na Cruz”.
3 – “O Crepúsculo dos Ídolos”
- Subtítulo: “Como Filosofar a Marteladas”. “Ídolos”: tudo aquilo que foi chamado de verdade até hoje. “Crepúsculo”: a velha verdade chega ao fim, eis a boa nova. Os alvos são desde ídolos eternos até as “idéias modernas”.
- “Prefácio”: Existe poder de curar mesmo no ferimento, e há mais ídolos que realidades no mundo.
- “Máximas e sátiras”: O que não me mata torna-me mais forte. Sem a música, a vida seria um erro. Procurei grandes homens e sempre encontrei somente os macacos do ideal deles.
- “O problema de Sócrates”: Os grandes sábios como tipos de decadência. Sócrates pertencia à classe mais baixa do povo, e era feio. O tipo criminoso é feio. Com a dialética a plebe chega ao alto, derrotando um gosto refinado. A ironia era uma espécie de ressentimento popular, e o dialético degrada a inteligência de seu antagonista. A luta contra os instintos foi apenas uma nova doença, e não um retorno à “virtude”.
- “A ‘razão’ na filosofia”: A moral é, no fundo, a negação dos sentidos. Só possuímos ciência enquanto aceitamos o testemunho de nossos sentidos, enquanto armamos e aguçamos nossos sentidos ensinando-os a se dirigirem ao fim que nos propomos. Quatro proposições: I – Outra realidade é absolutamente indemonstrável; II – A “essência das coisas” não passa de um mundo de aparências, uma ilusão de ótica moral; III – Falar de um “outro” mundo é uma vingança contra a vida a partir da fantasmagoria de uma “outra” (e “melhor”) vida; IV – A divisão entre mundo “real” e “das aparências” é sintoma de decadência, pois os sentidos são a única realidade.
- “Como o ‘mundo-verdade’ tornou-se uma fábula”: com o mundo-verdade abolimos também o mundo das aparências; é o fim do erro mais demorado, ponto culminante da humanidade.
- “A moral com manifestação contra a natureza”: Ao acreditar que é preciso matar as paixões, a Igreja é contrária à vida; tanto que prega a castração e a extirpação. A moral é uma idiossincrasia de degenerados que causou profundo mal.
- “Os quatro grandes erros”: I – Erro da confusão entre a causa e o efeito (trocar as condições pelos resultados); II – Erro da falsa casualidade (o espírito como causa); III – Erro das causas imaginárias (todo o domínio da moral e da religião); IV – Erro do livre-arbítrio (a habilidade teológica para tornar alguém “responsável”, para assim punir e julgar, encontrar culpados).
- “Aqueles que querem tornar a humanidade ‘melhor’”: O juízo moral tem em comum com o juízo religioso o crer em realidades que não existem. A moral da criação (hindus) e a da domesticação (cristãos) equivalem-se nos meios que utilizam para “melhorar” a humanidade.
- “O que os alemães estão na iminência de perder”: Os alemães são vítimas dos dois maiores narcóticos europeus: o álcool e o cristianismo. As grandes épocas da cultura são épocas de decadência política (ex.: Alemanha na Era Napoleônica, França depois da Restauração). Sendo assim, a cultura aristocrática deve ser estimulada, mesmo se isso gere decadência política.
- “Passatempos intelectuais”: A hipocrisia faz parte das épocas de sólidas crenças, e hoje é raro encontrar os verdadeiros hipócritas. A filosofia de Kant fornece a fórmula superior do funcionário de Estado: aborrecido e domesticado.
O egoísmo só tem valor se representa uma linha ascendente. Uma moral altruísta, baseada em motivos “desinteressados”, é quase a fórmula da decadência. É a desagregação dos instintos.
O cristão e o anarquista (mas também o socialista) são mais parecidos entre si do que se imagina. A partir de uma “bela indignação”, os dois atribuem o próprio mal-estar a algo, seja aos outros (anarquismo) ou a si mesmo (cristianismo). É como se alguém devesse ser culpado, e querem vingança para refrescar seu ódio mesquinho. Ambos, portanto, são decadentes.
Liberdade é ter a vontade de responder de si; ser indiferente à própria vida; pôr os instintos viris (de guerra e vitória) acima daqueles da “felicidade”. O homem livre é guerreiro, pois conquista seu valor. É preciso ter necessidade de ser forte.
Os grandes homens são como as grandes épocas – explosivos, e cuja condição primeira é uma longa espera e preparação para eles. Goethe e Napoleão foram dois dos poucos homens do século XIX que tentaram vencer os erros do século anterior (por exemplo, a sangrenta farsa da Revolução Francesa) por meio de um “retorno à natureza”; mas, não aquele de Rousseau (o 1º moderno, dotado de um desprezo enorme por si mesmo), porém a natureza sublime, livre e mesmo terrível.
- “O que devo aos antigos”: Aos gregos não devo absolutamente nada, pois eles não chegam aos pés dos romanos. Dionísio deve ser venerado, pois representa o instinto da vida, e a própria procriação como via sagrada. A orgia é sentimento de vida e de força transbordante. A vontade de viver dionisíaca é a chave para entender a tragédia – eis a eterna alegria do devir.
-“O martelo fala”: De fato, todos os criadores são duros. Somente o mais duro é o mais nobre.
4 – Influências
- Pós-modernos: tanto na estilística quanto no conteúdo, Nietzsche foi uma inspiração profunda para o pensamento considerado ‘pós-moderno’. Exemplos desse legado: perspectivismo, recusa às metanarrativas, filosofia assistemática, relativismo moral e a crítica radical aos valores da Modernidade. Ex.: Jacques Derrida, Gilles Deleuze, Michel Foucault.
- Existencialismo: Jean-Paul Sartre, Albert Camus e Martin Heidegger foram influenciados por idéias como a de que o homem deve definir a natureza de sua própria existência, assim como suas indagações sobre a existência de Deus.
- Ayn Rand: a obra desta romancista e filósofa libertária tem ecos nietzscheanos em vários aspectos, como o egoísmo racional em oposição ao altruísmo servil e o “super-homem” individualista e íntegro - John Galt ou Howard Roark, p. ex. Ainda nos EUA, o jornalista H. L. Mencken, de estilo corrosivo, traduziu algumas obras do filósofo alemão, valendo-lhe o apelido de “o Nietzsche americano”.
- Teoria das elites: o pensador falecido em 1900 demonstra aristocratismo ao reiterar que são raríssimos os homens que fazem alguma diferença para a humanidade. Portanto, o destino do mundo, inclusive o político, está nas mãos de alguns poucos dotados da “vontade de potência”.
- Do Nazismo ao Anarquismo: a revolta generalizada e muitas vezes contraditória de seu pensamento inspirou desde movimentos totalitários (o Nacional Socialismo alemão, que via em Hitler o “übermensch”) até posturas contrárias a todas as instituições sociais, como anarquistas e niilistas.
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